Compagnie Générale d'Eléctricité - central geradora da Baixa, local (1)

Sobre a primeira central geradora para fornecimento público de energia na cidade de Lourenço Marques (LM), actual Maputo surgiram dados novos e importantes que exploramos agora. 
Primeiro textos e informação fundamental da investigadora universitária Idalina Baptista (página da Universidade) que informou (com ligeiras adaptações) que "a primeira central pertenceu à empresa Compagnie Géneralé d'Electricité de Lourenço Marques que foi criada em 1897 numa parceria entre a Joost, Gubler & Cia. (uma empresa de representantes e import-export a quem tinha sido dada a concessão para o fornecimento de energia eléctrica por 50 anos em 1895) e a Banque Française de l’Afrique du Sud. As primeiras conversas para electrificar a cidade parecem ter começado em 1892, na mesma altura em que se procurava fazer uma concessão para o fornecimento de água. Segundo descrição (em inglês) no primeiro número da The Delagoa Bay Gazette, publicada por A.W. Bayly & Co. em 1899, a central foi inaugurada em 15 Novembro de 1898 em terrenos que antes eram de pântano“The Electric Light -- On the 15th November last [1898], in the presence of a distinguished company, H. E. the District Governor inaugurated the new electric light installation. The Central Works, which are the property of a company floated on a concession granted by the Government, cover 1,1000 square meters of what used to be swamp land. The company own 5,000 meters in all and have wisely it is thought, planned their operations on an extensive scale so as to enable them to cope with any extension the requirements of the town may warrant. The fine buildings are built of imported hollow bricks on steel framing and concrete foundations".
Do texto da Gazette retiramos que o terreno da central geradora era no antigo pântano e que tinha entre 5 000 m2  o que corresponderia a um rectângulo de 50 m por 100 m que mais ou menos corresponde ao que esteve depois demarcado nessa zona (que no entanto a notícia não localizava específicamente) e onde a central se inseria. 
Novo dado crucial para o tema é a FOTO 1 que mostra um edifício de dois pisos, um pavilhão por trás do seu lado direito que se vê muito parcialmente e uma chaminé alta mais recuada. A tabuleta na varanda do edifício diz "C. G. d'Electricité de Lourenço Marques" identificando claramente a sua função/propriedade e é a mesma companhia acima referida,

FOTO 1
Tabuleta: C. G. d'Electricité de Lourenço Marques em local desconhecido de LM
direitos: Scherl/Süddeutsche Zeitung Photo

Na FOTO 1 temos assim o que devia ser o edifício do escritório (para simplificar, pois devia também ser a administração, repartição técnica, atendimento, etc) da concessionária de electricidade de LM no início do século XX (20). A foto não é localizada para além de ser em LM mas por haver uma zona mais elevada com árvores para o fundo e pelo piso irregular em primeiro plano na foto, dava imediatamente indicação de que o edifício estava no limite do antigo pântano que tinha sido aterrado, sendo a encosta que se via para o fundo a antiga zona das "machambas". 
A posição deste edifício da CGd'E coadunar-se-ia então com a descrição do terreno feita na Delagoa Bay Gazette para a central da CGd'E. Seria espectável que nesses tempos primitivos da cidade a central e o escritório da firma estivessem próximos. Todavia a central não é claramente identificável na FOTO 1 embora as construções em redor do edifício parecem compatíveis com serem duma central (particularmente o pavilhão à direita e a chaminé recuada). É isso que tentaremos verificar ao mesmo tempo que tentamos localizar concretamente a posição da FOTO 1.

Para localizar a FOTO 1, noutro artigo tinhamos conseguido localizar um postal de cerca de 1902 onde se via uma fábrica movida a vapor (pela grande chaminé). Fiz aparecer esse postal à esquerda da MONTAGEM 1, à direita da qual coloquei a FOTO 1 principalmente com o escritório da CGd'E. Dadas as notórias semelhanças da paisagem nas duas fotos comparei-as em pormenor e temos então à esquerda: postal de artigo anterior e à direita: FOTO 1 e as equivalências seguintes.   



MONTAGEM  1 
Castanho claro: edifício comprido de telhado descendo para o lado dum pavilhão 
que devido à proximidade da chaminé devia ser industrial (fábrica)
Preto: à esquerda a chaminé da fábrica que tem 
desenho e posição semelhante à da chaminé da FOTO 1 
Azul escuro: aresta do telhado do pavilhão 

A partir destas equivalências e pelo que se sabe em relação às ruas e à fábrica da foto da esquerda, podemos fazer as seguintes deduções para a localização e conteúdo da FOTO 1:
Verde: Av. Álvares Cabral, actual Manganhela
Carmesim: Av. Paiva Manso, actual Magaia, que se cruza com a Manganhela na perpendicular
Laranja claro: Av. Manuel de Arriaga, actual Marx
Azul médio: telhados dos pavilhões que não estavam visíveis na FOTO 1. 
Noto que não se vê na foto da esquerda o escritório da CGd'E, a menos que o marcado a roxo à direita seja o seu lado virado a poente = oeste. Mas conhecendo-o agora perfeitamente da FOTO 1, há muitas fotos panorâmicas da cidade onde se pode confirmar que ele estava de facto nessa esquina (mas parece que ninguém nos 40 ou 50 anos seguintes o fotografou de perto, daí o edifício ter entrado em esquecimento pelo menos na net).
Criámos assim a MONTAGEM 2 onde à esquerda recordamos o escritório da CGd'E da FOTO 1, em cima colocámos uma das fotos aéreas onde ele aparecia e é aí identificável pelos dois pisos, varandas alpendradas, feitio do telhado e quatro portas/janelas do lado da Av. Manuel de Arriaga, actual Marx (laranja claro) e em baixo colocámos outra foto em que tanto o escritório da CGd'E como pelo menos a chaminé da fábrica tinham desaparecido mas restava um dos antigos pavilhões. A foto de cima da MONTAGEM 2 deve ser de 1950 (prédio Cardiga em construção) e a de baixo da segunda metade dos anos 50 (era ainda anterior ao edifício da JCE que não se vê neste pormenor ter recebido a torre piramidal)

MONTAGEM 2 
Antes = com = em cima  e depois = sem = em baixo
o escritório da CGd'E na esquina das:
Verde escuro: Av Manganhela, antiga Álvares Cabral
Laranja claro: Av. Marx, antiga Manuel de Arriaga
Vermelho: telhado do edifício do escritório da CGd'E
Preto: chaminé da fábrica
Azul claro: telhado dos pavilhões maiores,
colocados na maior dimensão paralelamente à Av. Marx
Azul escuro: aresta do telhado do pavilhão maior do lado sudoeste
Branco: pavilhão que apareceu depois dos dois iniciais
Verde claro: Mercado, ala nascente = leste

Penso que conseguimos assim, a partir dos novos dados: 
1. confirmar que havia instalações industriais (uma fábrica que se deduz pela chaminé ser movida a vapor e com vários pavilhões) em redor do que com a FOTO 1 ficámos a saber era um edifício da CGd'E;
2. localizar concretamente o local da FOTO 1 confirmando a informação inicial de que era no (limite do) antigo pântano (ver ainda mapa em baixo) e de que a área do seu terreno era compatível com a anunciada para a central à altura da inauguração.
Com estes factos, qual é a probabilidade de a fábrica que se via melhor na MONTAGEM 1 à esquerda não ter sido a primeira central geradora de electricidade de LM? Acho que pequena e até prova em contrário considerarei que a central da CGd'E esteve no terreno face à actual Av. Marx do lado oeste e entre a Rua da Electricidade a norte e a actual Av. Manganhela a sul.

Num artigo seguinte ver-se-á como terá sido inicialmente e como evoluiu a disposição destas instalações no terreno e resumir-se-à o que se passou depois de 1897 com as concessões de electricidade em LM, actual Maputo. A concessão da CGd'E tinha incluído também a rede de iluminação pública que era alimentada por esta central. Segundo uma notícia publicada em 1898 essa rede ficou pronta em Junho desse ano, por isso um pouco antes da central geradora (Novembro de 1998) mas com certa coordenação como seria de esperar.

PS: Em artigos anteriores tinhamos mostrado o mapa de LM com a sobreposição da ilha inicial e da cidade estruturada actual. A precisão da montagem não é muita mas com ela pode verificar-se que o cruzamento entre as actuais Avs. Marx e Manganhela de onde é a FOTO 1 (na sua esquina a noroeste) era mesmo no limite norte do pântano como ela visualmente deixava perceber. Neste mapa o pântano é a banda verde que rodeia a ilha inicial pelo lado norte (as ruas roxas são as da zona do presídio na ilha inicial). A terra firme começava onde aparecem as árvores desenhadas no mapa.

Verde: antiga Av. Álvares Cabral, actual Manganhela
Laranja claro: antiga Central, depois Manuel de Arriaga, actual Av. Marx
Vermelho: escritório da CGd'E (CGE), no limite entre o pântano e a terra firme

Círculo preto: entrada do Mercado Municipal construído no início do século XX

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